Auditoria expõe desvios de materiais da Nike no Corinthians

Relatório aponta descontrole, comércio clandestino e atuação do vice Armando Mendonça em retiradas irregulares de materiais esportivos

Por: Lucas Soares
9 horas atrás em 17 de novembro de 2025
Foto: Emilio Botta



Uma auditoria interna realizada no Corinthians identificou um cenário grave de descontrole, irregularidades e até comércio clandestino envolvendo materiais esportivos fornecidos pela Nike. O relatório, enviado ao presidente Osmar Stabile, ao Conselho Deliberativo e à Polícia Civil, coloca o vice-presidente Armando Mendonça como figura central em inconformidades apontadas pelos auditores.

Segundo o documento, o Corinthians recebeu 41.963 itens da Nike em 2025, número que, somado ao ano anterior, representa um estouro de 297% da cota contratual, fixada em R$ 4 milhões anuais. Mesmo com a quantidade recorde, as categorias de base e modalidades olímpicas seguem sem uniformização adequada, usando peças desgastadas, remendadas ou modelos de coleções defasadas, como uniformes de 2019 e 2021. O clube chegou a gastar R$ 776 mil na compra de itens licenciados para suprir lacunas que deveriam ser cobertas pelo contrato com a Nike.

O relatório lista falhas consideradas graves: grande acúmulo de materiais sem destinação; quatro anos sem inventário físico no almoxarifado; R$ 6,4 milhões em notas fiscais não lançadas nos sistemas internos; distribuição desigual entre departamentos; retiradas feitas por pessoas não autorizadas e indícios de corrupção interna, com funcionários vendendo peças oficiais a R$ 150 e R$ 180. Um funcionário foi flagrado durante a venda ilegal e admitiu participação no esquema.

O descontrole chamou atenção em setembro, às vésperas da partida contra o Fluminense. O clube percebeu que não havia camisas brancas suficientes para compor o uniforme principal. Sem reposição imediata da Nike, o Corinthians precisou pedir ao rival autorização para que ambos atuassem com uniformes reservas no Maracanã.







Entre 6 de junho e 30 de outubro, o vice-presidente retirou 131 itens, sem contar as camisas extras solicitadas em dias de jogo sob a justificativa de “relacionamento da diretoria”. O relatório aponta diversos episódios envolvendo o dirigente: pedido das 19 camisas especiais usadas no jogo contra o Palmeiras, com patch da NFL; cancelamento do pedido após ciência da auditoria, seguido pela retirada informal de oito peças; retiradas diretas na rouparia do CT sem registro ou autorização e solicitações constantes de itens adicionais por fora do fluxo de aprovação.

Os auditores também registraram que Mendonça teria demonstrado comportamento intimidador. Em conversas com o diretor de Tecnologia, fez comentários agressivos e com teor interpretado como ameaça. Em outra situação, entrou sem convite em uma reunião com representantes da Nike e tentou conduzir o encontro de maneira unilateral, gerando constrangimento.

Condições precárias na base





Apesar da enorme quantidade de itens retirados ao longo do ano, apenas o Sub-20 recebeu um kit completo de treino da coleção 2025. Modalidades como futsal, basquete de base e esportes aquáticos não receberam sequer uniformes mínimos para treinos e viagens. Auditores encontraram peças rasgadas, desbotadas e remendadas em uso cotidiano.





Camisas do time de futsal e da base em condições precárias. Foto: Reprodução/MeuTimão




Armando Mendonça classificou o relatório como “tendencioso” e negou ser responsável pela política de distribuição dos materiais. Segundo ele, sua função é analisar pedidos extras e buscar mais transparência; retiradas feitas por ele são destinadas a ações de relacionamento; jamais desrespeitou auditores ou interferiu na investigação e entrou com notificação extrajudicial contra declarações que considera falsas.

Além de expor as irregularidades, a auditoria apresentou 17 recomendações para melhorar a governança interna. As conclusões foram encaminhadas também à Polícia Civil, que já conduz inquérito sobre o desvio de materiais no clube. A diretoria do Corinthians não se manifestou até a publicação desta matéria.